Tóquio – Não são só as crianças que sofrem com o sistema rígido do Japão, excesso de atividades ou bullying. Nas escolas, os professores também estão adoecendo e os casos de licença médica por doenças psíquicas ou suicídio tem chamado a atenção do governo.
Em 2017, Tetsuo* tinha 29 anos e atuava como professor de uma escola pública em Osaka. Foi nesta época que ele começou a perceber que estava com problemas de saúde mental.
Tetsuo era responsável por uma turma, exercia funções no clube esportivo e coordenava os ajustes dos alunos com planos de fazer intercâmbio na Austrália. Ele trabalhava até tarde da noite todos os dias e só conseguia tirar folga quando o clube esportivo fechava para os exames periódicos.
Neste ritmo intenso, adoeceu. Tetsuo foi diagnosticado com transtorno de ansiedade e o médico emitiu um parecer de que ele não deveria trabalhar por um mês inteiro, mas não cumpriu.
“Não tinha outro professor que pudesse pegar as funções que eu tinha. Eu pensei que se me ausentasse, os alunos acabariam prejudicados, então devolvi o atestado ao hospital”, contou ao jornal Yomiuri.
Mas Tetsuo precisou se ausentar por alguns períodos mesmo assim e está melhor hoje, mas segue em tratamento. Os remédios e as consultas se tornaram essenciais na sua rotina.
“Se não podem reduzir as funções em cima de um professor, eu acho que deveriam aumentar o número de professores”, sugere.
Mas isto também tem sido um desafio, por causa da falta de mão de obra que também atinge as escolas. O número insuficiente de docentes aumenta a carga em cima dos que estão em atividade.
Os dados do governo japonês mostram que, entre 2015 e 2020, aumentou 1,5 vezes o número de professores na faixa de 20 anos com atestado médico de doenças psíquicas. A tendência é mais elevada do que em outras faixas etárias e o Ministério da Educação (MEXT) deve efetuar medidas preventivas a partir do próximo ano.
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Suicídio de professores
Um japonês de 62 anos, que trabalhava para uma organização em Mihama (província de Fukui), está intimamente relacionado com este tema. Há alguns anos, ele perdeu o filho de 27 anos, que atuava como professor em uma escola ginasial.
Ele era responsável por uma classe e pela disciplina de sociologia, tinha funções no clube esportivo de beisebol e também cuidava de atividades de fora de sua especialização, como conversar com os pais dos alunos que tinham problemas de comportamento.
O acúmulo de funções resultou em uma carga acima de 80 horas extras mensais, que por vezes passava de 90 horas. Este nível já é considerado de alto risco de morte por excesso de trabalho.
O jovem professor acabou cometendo suicídio e deixou um diário que foi entregue ao pai. Nas páginas do caderno, dizia que não conseguia preparar as aulas e tinha medo até de dormir. Ele também dizia que não importava o jeito que conversava com os pais sobre os filhos desobedientes, eles sempre reagiam enfurecidos.
O pai processou a província e a cidade pelo caso do filho e em julho de 2019, a relação do suicídio com o trabalho foi reconhecida e o juíz ordenou uma indenização de ¥65,4 milhões para a família da vítima.
“Ele também escrevia no diário que teve uma nova ideia de aula e que os alunos do primeiro ano elogiaram porque ficou fácil de entender. Ele pensava no bem das crianças e não reclamava de nada, dava muito duro para tentar dar conta do trabalho”, lamentou.
Os dados do Ministério da Saúde do Japão, organizados com as notificações da polícia japonesa, mostram que nos últimos 5 anos até 2021, 61 professores entre 20 e 29 anos de idade cometeram suicídio. Em 49% do casos, foi possível confirmar que o motivo se deu por conta de problemas no trabalho.
Em entrevista ao Jornal Yomiuri, Masahito Ogawa, professor da Universidade de Tóquio e especialista no modelo de trabalho de docentes, comentou que muitas melhorias precisam ser efetivadas nas escolas para evitar estes casos.
“Os professores jovens e sem experiência acabam pressionados e encurralados por este estilo de trabalho. O setor administrativo das escolas deve manter um controle sobre as funções e carga horária, fazer ajustes necessários e promover um ambiente que seja fácil consultar e pedir ajuda”, declarou.
*nome fictício