Tóquio – o executivo líbano-brasileiro, Carlos Ghosn, surpreendeu o Japão e o mundo em 2019, quando protagonizou uma fuga digna de um filme de Hollywood, embarcou em um jatinho em Tóquio sem que as autoridades notassem e fugiu para o Líbano onde está até hoje.
O caso do executivo, que liderava a aliança entre as montadoras Renault, Nissan e Mitsuishi e foi acusado de crimes financeiros, fez o Japão se dar conta de uma fragilidade em seu sistema. Depois de 130 dias na prisão e de pagar US$ 7,2 milhões de fiança, ele deveria ficar em casa aguardando o julgamento no ano seguinte, mas não havia nada que controlasse sua localização.
As tornozeleiras eletrônicas são muito utilizadas em países com o Brasil e se tornam itens familiares aos políticos acusados de corrupção, que ganham o direito de cumprir pena em casa.
O Ministério da Justiça do Japão decidiu propor uma revisão de lei, que já foi aprovada. Segundo uma reportagem da Emissora Fuji, o Ministro da Justiça, Ken Saito, explicou que um novo sistema será criado para acompanhar a localização de criminosos ou réus que estão soltos sob fiança.
Inicialmente, a ideia é utilizar a tornozeleira nos casos em que a justiça entender que há risco de o réu tentar deixar o país durante o período de liberdade que antecede o julgamento. Se tentar remover a tornozeleira eletrônica, o indivíduo deve ser preso imediatamente e ficar detido por até um ano como penalização.
Por enquanto, a medida terá foco em casos semelhantes ao do executivo. No entanto, é possível que o Japão considere o uso do artefato também em casos como o de alguns estrangeiros ilegais, com ordem de deportação e liberdade provisória, que desapareceram depois de obter o benefício.
Há centenas de casos que o Ministério da Justiça do Japão perdeu o controle. Alguns estrangeiros que cumpriram pena no presídio, perderam o visto e estavam no processo de deportação, mas sumiram depois de conseguir a autorização para aguardar os trâmites em liberdade.
Nestes casos, dificilmente o estrangeiro irá sair do país, já que na maioria dos casos a deportação é recusada. Mas conseguem se manter escondidos no Japão e fogem das obrigações com a justiça japonesa. Estes casos também estão na mira do governo, que busca uma solução para não perder o controle de quem está para ser deportado.
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A fuga de Carlos Ghosn
Reprodução / Aeroin.net
O Japão está tomando medidas para evitar que a fuga de Carlos Ghosn se repita em outros casos que estão nas mãos da justiça japonesa, mas é bastante improvável que um caso tão particular como este volte a acontecer.
O executivo tomou riscos enormes para fugir de uma condenação quase certa no Japão, por causa do sistema que ele criticou como injusto. O país tem uma taxa de condenação de 99%, costuma aplicar longas detenções e interrogatórios insistentes que visam arrancar uma confissão antes do julgamento.
Em dezembro de 2019, depois de 8 meses de prisão domiciliar, Ghosn conseguiu passar despercebido no aeroporto porque estava em uma grande caixa de equipamento de áudio que não foi verificada. Ele embarcou em um jatinho e voou para a Turquia, onde trocou de aeronave e foi ao Líbano.
Sem acordo de extradição com o país árabe, não há nada que o Japão possa fazer para recuperar o fugitivo. Ghosn está seguro das autoridades japonesas, mas não pode deixar o Líbano por estar na lista da Interpol.
O caso é tão extraordinário, único e improvável que inspirou um documentário chamado de “Carlos Ghosn: o último voo”. A produção conta a história controversa do homem que salvou a Nissan da falência no passado, se tornou um ícone do mundo dos negócios, mas sofreu graves acusações de subnotifação de renda, quebra de confiança e uso indevido do dinheiro da Nissan. Ela nega as acusações até hoje e diz ter sido vítima de vingança e conspiração.