As reclamações de idosos que estão impedindo crianças de brincar em parques no Japão
Quando o Japão entrou em estado de emergência no início da pandemia, em abril de 2020, e as aulas foram suspensas, mais famílias começaram a levar os filhos para brincar em parques e pracinhas.
Depois de um tempo, a presença das crianças foi desaparecendo de vários parques onde os pequenos costumavam correr e brincar. Um ano depois, a situação continua notável e o motivo tem pouco a ver com a pandemia.
Uma reportagem do portal News Post Seven contou que placas de proibido e reclamações de idosos passaram a desencorajar muitos pais e retiraram das crianças um local que antes era saudável para elas.
Ayumi Makita (nome fictício) está na faixa de 30 anos, mora na província de Chiba e é mãe de duas crianças, de 4 e 2 anos. Ela contou ao portal que costumava levar as crianças depois do horário da creche e nos fins de semana para brincar em um parque próximo de casa.
No entanto, no outono do ano passado, se deparou com um aviso escrito em letras vermelhas no local destinado ao lazer das crianças.
A placa dizia que as crianças faziam muito barulho e incomodavam os moradores locais, principalmente idosos, então estava proibido fazer barulho mesmo durante o dia.
O aviso também dizia que estava proibido correr e brincar com bola, pois há muitos idosos na região e as crianças poderíam machucá-los por acidente.
No fim, havia a informação de que a placa foi instalada pela associação dos moradores do bairro.
“Não podemos ir a nenhum lugar por causa do coronavírus, então eu pensei que na vizinhança e em um lugar aberto, que dá para manter distância, eu podia deixar as crianças brincando. Porém, depois que aquela placa foi instalada no parque, eu senti que brincar lá era algo ruim. Percebi que muitos pais deixaram de levar seus filhos também”, desabafou Ayumi.
O parque é administrado pela prefeitura local e as instruções sobre como brincar estão dispostas em outra placa, que diz para não fazer barulho muito cedo de manhã ou tarde da noite, evitar jogos com bolas pesadas, golfe e fogos de artifício.
“As regras da associação do bairro vão além da regulamentação do parque. Eu perguntei a eles e disseram que havia reclamações. A prefeitura diz que cada associação tem seu jeito de ver as coisas. Eu fico me perguntando, o parque infantil serve para quê, afinal?”, questionou Ayumi.
Depois do aviso, a presença das crianças que jogam futebol ou andavam com jogos portáteis nas mãos foi desaparecendo e aos poucos, os idosos passaram a frenquentar o parque e passar tempo descansando nos bancos.
Ayumi conta que as placas de proibido surgiram repentinamente nos parques próximos, diminuindo as possibilidades de brincar com as crianças ao ar livre. E mesmo nessas circunstâncias, não adianta fazer uma consulta, pois as prefeituras não tomam providências.
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Idosos e parques no Japão
Problemas semelhantes também têm sido observados em outras províncias no Japão.
Makoto Yoshimoto (nome fictício) é um japonês na faixa de 40 anos, que vivem em Kanagawa e trabalha para uma empresa. Por causa da pandemia, ele conta que passou a fazer home office e percebeu uma mudança no movimento do parque perto de casa, que consegue observar pela janela.
As crianças desapareceram do parque e o ambiente mudou por completo. Neste local, a mudança também foi ocasionada por uma placa instalada pela associação de bairro, proibindo as crianças de brincarem livremente.
“De manhã os idosos passaram a fazer ginástica no parque e de tarde eu os vejo tomando sol. No fim da tarde não há ninguém e de noite há jovens que se encontram para beber e fumar. Sinto que a zona ao redor do parque se tornou perigosa e os frequentadores comuns já não aparecem mais”, relatou.
Yoshimoto conta que ficou surpreso quando descobriu o motivo da mudança no ambiente do parque.
“Depois da pandemia, as crianças que brincavam lá desapareceram. Lembro de ouvir vozes alegres logo pela manhã, mas não pensei que fossem gerar reclamações. O “aviso” da associação do bairro era de que as crianças faziam barulho e estavam causando problemas de saúde nos idosos”, explicou.
Este aviso foi colocado no parque depois do feriado de Golden Week, em maio do ano passado. As famílias que leram o aviso de que as crianças estavam causando problemas de saúde nos idosos logo deixaram de frequentar o local. No lugar delas, os moradores mais velhos passaram a utilizar mais o parque.
“Agora os idosos também não respeitam as regras. Estão comendo, bebendo e levando os animais de estimação onde é proibido. Um membro jovem da associação de bairro já os advertiu, mas essas associações são formadas por idosos e então prevalece as regras deles”, lamentou Yoshimoto.