Tóquio – Se tem um povo que é alvo antigo da discriminação contra estrangeiros no Japão é o coreano. Depois do período de ocupação japonesa na Península Coreana (1910 – 1945), muitos coreanos passaram a viver formalmente no Japão, constituíram famílias e criaram raízes definitivas.
Algumas gerações depois, muitos descendentes já não sabem mais falar coreano e têm pouco contato com a cultura dos antepassados, mas ainda sofrem discriminação por não serem originalmente japoneses.
A onda de preconceito contra os “zainichi”, como são chamados, já fez com seus nomes fossem associados ao crime e muitos cresceram utilizando nomes japoneses e ocultando as raízes para não serem maltratados.
É contra isto que a sul-coreana Che Kan’ija, de 48 anos, luta no Japão. Ela é uma “zainichi” de terceira geração, mas nasceu e cresceu em Seul, capital da Coreia do Sul. Como cidadã coreana, se revoltou com a discriminação que encontrou no Japão. Che migrou ao país vizinho, que tem história com sua família, em 1999 para um intercâmbio. Ela se tornou fluente em japonês e decidiu fincar raízes.
Che publicou livros sobre a causa coreana e tem um blog, onde publica constantemente artigos que visam gerar questionamentos e conscientizar. Nas redes sociais, reúne cerca de 40 mil seguidores e apoiadores da causa. Mas a vida de exposição e luta na internet trouxe um problema que levou Che aos tribunais: os “haters”.
Segundo uma reportagem do jornal Mainichi, a coreana decidiu processar um internauta que parece acessar com frequência suas publicações. De 2016 a 2020, o mesmo homem teria comentado inúmeras vezes em seus posts, com pequenos textos e palavras discriminatórias e ofensivas. Comentários que mandavam “Che” voltar ao país dela.
Para os estrangeiros que vivem no Japão, este tipo de discurso está longe de ser incomum. Até mesmo nas escolas, brasileiros e crianças de outras nacionalidades passam por essa experiência de serem “mandadas” de volta ao país de origem, em uma atitude que diminui e faz a pessoa sentir que não pertence ao ambiente.
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Danos psicológicos por ser discriminada
Em uma audiência pública com os advogados, Che falou que sentiu pressão psicológica com as palavras discriminatórias do internauta e que aquele tipo de manifestação era “inaceitável”. Ela disse que simplesmente não podia deixar por isso mesmo e que irá cobrar uma indenização.
“Desejo que este tribunal tome uma decisão que comprove que a discriminação é imperdoável. Só este resultado trará um pouco de conforto”, comentou.
A advogada responsável pelo caso, Yasuko Morooka, também comentou sobre a indignação com as atitudes discriminatórias contra estrangeiros que estão fazendo suas vidas no Japão.
“Esse tipo de alegação como ‘volte ao seu país’ faz um uso de má índole da posição do sujeito que diz e é um nativo. É algo de mau-caráter e não se trata de um tipo de comentário que temos que aceitar por causa da liberdade de expressão”, sugere.
Por outro lado, o homem que foi acusado de perseguir com comentários ofensivos enviou uma carta explicativa, afirmando que não teve o objetivo de promover “ideias discriminatórias” ou causar dano.
No documento, o internauta disse que suas palavras eram apenas a maneira como expressa seus sentimentos e opinião pessoal e que isto “não se trata de” algo capaz de reduzir sua estima social através de uma acusação. Ele pediu que a solicitação de indenização seja rejeitada.
O caso será julgado em breve.