Yokohama – A única forma de combater o assédio sexual dentro do trem no Japão, algo que acontece com bastante frequência, é com a ação proativa das vítimas, que devem segurar o criminoso pelo pulso e chamar atenção para receber ajuda.
Em teoria, os passageiros mais próximos deveriam ajudar a segurar o acusado e servir como testemunha, enquanto o botão de emergência é acionado, funcionários aparecem e conduzem o homem para o fora do vagão na estação seguinte, junto com a vítima para dar depoimento.
Uma mulher japonesa que passou por um episódio recente disse que, na prática, tudo funciona de um jeito exaustivo e constrangedor. Depois de passar por essa experiência, ela desabafou:
“Sinceramente, na próxima vez que um pervertido me atacar dentro do trem, eu não sei se vou conseguir acionar a polícia como eu fiz dessa vez”.
A mulher em questão é Yuka*, de 33 anos de idade e com residência na cidade de Yokohama. Ela deu entrevista ao portal Kanaloco e contou que o caso aconteceu depois da meia-noite de um fim de semana, em um trem da linha Sotetsu.
Ela ocupou um assento no estilo cabine, com dois bancos diante de si. Um homem se aproximou de repente e tentou tocar em suas pernas. A mulher se esquivou e mesmo mandando parar, ele continuou se aproximando e tentando tocá-la.
Yuka tomou coragem para segurá-lo pelo braço e gritar dentro do vagão que o passageiro era um tarado e ela precisava de ajuda urgente.
“Eu gritei, pedi ajuda e ninguém apareceu. Tinha pouca gente no vagão, mas nenhum deles veio, era tarde e eu pensei que não teria nenhum funcionário para ajudar. Eu fiquei com medo, se o homem fosse agressivo e tentasse fugir, não sei o que eu poderia fazer”, disse.
Depois de algum tempo, ela conseguiu ajuda de um funcionário e a polícia foi acionada. Porém, denunciar um tarado em um trem no Japão não é uma tarefa simples e toda a condução provocou constrangimentos, exaustão e perda de tempo.
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A denúncia após assédio em trem no Japão
Yuka contou que, primeiramente, foi levada para uma sala pequena dentro da própria estação, onde passou duas horas contando tudo o que aconteceu no trem. Depois disso, foi levada para a delegacia e teve que passar mais duas horas contando a história repetidas vezes e para pessoas diferentes.
“Eu explicava tudo a eles e então chegava outro policial encarregado na sala e eu tinha que contar tudo de novo do zero. E assim eu passei mais de 4 horas envolvida com a polícia na estação e na delegacia para que fosse possível fazer a denúncia”, contou.
E o caso não acabou aí. Uma semana depois, Yuka teve que voltar no posto policial para mais uma coleta de informações e a emissão de documentos relacionados ao caso criminal.
“Eu fiquei exausta de várias formas, mentalmente e fisicamente. Eu já tinha ouvido comentários de que era assim, mas foi só viver isso na prática para eu entender o quanto é penoso e faz com que a gente perca a vontade de denunciar”, lamentou.
A presidente do Centro de Prevenção ao Assédio Sexual (Chikan Boushi Katsudou Center), Yayoi Matsunaga, disse que é “muito comum” que as mulheres que passam por essa situação em um trem no Japão não recebam nenhuma ajuda dos outros passageiros ao redor.
“Se não houver testemunhas, o acusado pode negar e isto torna o processo mais difícil. Precisamos de uma sociedade que não enxergue isso como um problema do outro, as pessoas devem tomar consciência e se aproximar da vítima, ajudar a denunciar. O processo com a polícia realmente leva tempo, mas não dá para desconsiderar os sentimentos da vítima”, afirmou.
A polícia poderia tomar medidas para que a condução dos casos se torne menos exaustiva ou constrangedora para a vítima. “É interessante que policiais mulheres conduzam as conversas com a vítima e que seja muito bem explicado todo o procedimento e a necessidade de colaboração”, sugeriu.
*Nome fictício.