Osaka – Um golpe inesperado, difícil de imaginar e fácil de cair. Residentes de um “danchi”, uma moradia pública na cidade de Osaka, voltada para famílias de baixa renda, acabaram enganados pelo vizinho que desempenhava o papel de líder do conselho de moradores.
O depoimento das vítimas mostram que ele pode ter agido com segundas intenções desde o início. O caso foi relatado em uma reportagem da emissora Fuji, mas o homem não teve o nome divulgado. Ele foi identificado apenas como “N” e será chamado assim durante esse texto.
O caso aconteceu em um conjunto de apartamentos públicos com 35 anos de história e cerca de 100 famílias residentes. Uma das principais vítimas foi “A”, um homem de 48 anos que vivia em um apartamento com a esposa e filhos. Ele caiu na lábia de “N”, confiou na reputação do homem, acreditou na história e acabou entregando meses de aluguel nas mãos dele.
Enquanto “N” era o líder do conselho, “A” cuidava das finanças da organização, que arrecadava fundos para eventos e atividades dos moradores. Por ser o responsável pelas finanças, ele foi o primeiro a ser enganado no golpe.
“No início início ele era muito prestativo, chegou até a montar um grupo para vigiar e proteger as crianças. Parecia que tinha chegado uma pessoa perfeita no danchi. Ele tinha uma aparência rígida, parecia um pouco rude ou agressivo, mas era muito gentil e gostava de conversar”, descreveu “A”.
O líder do conselho era um homem na faixa dos 60 anos que conquistou a confiança dos moradores e chegou a liderança pela capacidade de resolver os problemas e ajudar.
“Um de seus feitos foi resolver o problema que a gente tinha para deixar as bicicletas. Ele conversou com a prefeitura e fez com que instalassem um bicicletário. Ele tinha um poder de fazer as coisas acontecerem”.
E essas características fizeram com que “A” e outros moradores, principalmente os que estavam mais envolvidos no conselho, acreditassem cegamente no homem. Quando ele bolou um plano para tirar dinheiro dos moradores, ninguém desconfiou.
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Como o golpe aconteceu
De acordo com o relato de “A”, tudo aconteceu quando ele foi chamado por “N” de repente na sala de reuniões do conselho para uma conversa importante.
“Eu cheguei lá e ele disse que ia conversar com algumas pessoas, mas ia adiantar o assunto comigo”, relatou. “E então ele disse que se a gente reunisse os aluguéis de algumas famílias, pagasse junto e adiantado, o setor administrativo nos daria um desconto de até 50%. Era uma conversa secreta, eu não deveria contar para ninguém”.
De acordo com a história de “N”, os moradores poderiam se unir para pagar adiantado e ganhar o desconto depois. “N” seria o responsável por reunir o dinheiro e mandar para a prefeitura e nos mês seguinte, os moradores não precisariam pagar.
A reportagem da Fuji questionou “A” sobre o motivo de ter acreditado na história, embora fosse estranha desde o início.
“Eu fui inocente e fiquei bem feliz, para ser sincero. Acreditei que o aluguel ficaria barato e eu acreditava nele. Ele disse que era para um número limitado de moradores, fez parecer algo exclusivo que a prefeitura estava nos concedendo”, disse.
Acreditando na história, “A” deu o equivalente a dois meses de aluguel adiantados para “N” e no mesmo mês, recebeu o desconto do aluguel da prefeitura normalmente.
“Ele juntou o dinheiro de umas cinco ou seis famílias e disse que depois que reunisse o dinheiro todo e fizesse o pagamento, não seria preciso pagar o aluguel. Então pareceu óbvio que naquele mês ainda a gente pagasse o aluguel normalmente. Ele me convenceu e ainda disse para não ligar para a prefeitura e nem comentar com ninguém”, relatou.
A lábia do homem foi suficiente para garantir que as famílias envolvidas pagassem o dinheiro e ficassem quietas, como se tivessem recebendo um privilégio que ninguém poderia saber ou daria errado.
Confiante de que ficaria um bom tempo sem se preocupar com a despesa de aluguel, “A” acabou entregando ao líder do conselho as economias de ¥600 mil, equivalentes a metade de 19 meses de aluguel.
Um tempo depois, a história vazou e ele recebeu uma correspondência em casa da prefeitura, alertando que o aluguel não ficaria pela metade do valor em hipótese alguma. Foi assim que “A” descobriu o golpe.
Ele foi na polícia denunciar o caso junto com outros moradores, mas “N” já tinha desaparecido com cerca de ¥15 milhões que recolheu de várias famílias. Ele ainda está registrado como morador do prédio, mas não aparece mais e o telefone está sempre desligado.
O envolvimento no golpe
O caso de “A” foi ainda mais grave do que os outros moradores. Além de dar o próprio dinheiro, ele ajudou o golpista a recolher as quantias das famílias, o que fez parecer que o esquema era mesmo sério e real.
Além disso, “N” usou o nome de “A” sem autorização para recolher dinheiro dos vizinhos, aproveitando a autoridade dele de diretor financeiro do conselho de moradores.
“Ele escreveu o meu nome sem eu ter sido informado e mandou fazer um carimbo igual o meu, usou isso em documentos. Acho que mais um pouco e eu ia ser tratado como cúmplice e criminoso junto com ele, não posso perdoar isso”, lamentou.
A prefeitura explicou que não existe nenhum sistema de pagamentos de aluguel que garante metade do preço aos moradores e que a prefeitura não tem controle nenhum sobre a gestão de conselhos de moradores.
“O valor do aluguel é definido ano a ano de acordo com a renda declarada pelos moradores. Não há como um membro de conselho intermediar esse pagamento, não existe esse sistema e nós não temos poder para fiscalizar ou interferir na gestão de conselhos de moradores”, explicou um representante da prefeitura.
Os apartamentos são ocupados por famílias de baixa renda e muitos idosos que acabaram entregando as economias ao golpista, continuam pagando o valor total de aluguel e só contam com a esperança de ver o homem sendo preso e receber o dinheiro de volta se possível.
Um dos enganados foi uma moradora de 74 anos de idade, que vive com a aposentadoria e estava preocupada com as dificuldades financeiras e o dinheiro que precisaria para seu sustento no futuro. Por isso, a oportunidade de ganhar 50% de desconto no aluguel acabou sendo tentadora.
“No início a prefeitura descontou o aluguel normalmente e eu cheguei a pensar que talvez não fosse uma boa ideia entregar meu dinheiro para ele, mas teria sido melhor consultar a prefeitura sobre isso. Só que ele disse que a gente não podia falar com a prefeitura e eu ia ficar com um conforto financeiro bom com esse desconto, então entreguei o dinheiro e não comentei nada com ninguém”, lamentou.
Os moradores e famílias que tinham alguma economia guardada e acreditaram na história, acabaram perdendo o dinheiro e a situação financeira só piorou diante da promessa de aluguel pela metade.
“Esse dinheiro foi guardado com muito esforço e trabalho, era um dinheiro que a gente podia usar em uma emergência. Nunca sabemos o dia de amanhã, se aparece uma doença e tem que gastar e agora não temos mais, é imperdoável. Eu só quero que ele apareça e devolva o que nos tirou”, disse “A”.
“A” acabou se mudando para um lugar mais barato com a família, por causa do dinheiro que perdeu com o golpe. A polícia confirmou que recebeu as denúncias, mas não sabe o paradeiro do homem. Já faz um bom tempo que nenhum vizinho vê “N” na região e o telefone não recebe nenhuma chamada.