Tóquio – Chegar na vida adulta sem muitas perspectivas, com um trabalho exaustivo e horas extras gratuitas não é algo tão raro no Japão. O País ainda tem leis trabalhistas frágeis, pouca fiscalização e um bom número de empresas que não cumprem o básico.
Chamadas de “black kigyo”, essas empresas impõem longas jornadas, com horas extras sem compensação e salários baixos. E mesmo nas empresas comuns, não são poucos os casos de trabalhadores que não conseguem tirar férias ou a quantidade de dias que tem direito ou que não são liberados nem para acompanhar o nascimento do filho.
O portal Career Connection, de assuntos trabalhistas, apresentou o caso de um homem japonês, com idade entre 35 e 39 anos. Kazuhiro (nome fictício) respondeu um questionário sobre condições de trabalho e contou que tem renda de ¥2,8 milhões por ano e chega a fazer 100 horas extras gratuitas no mês.
“Eu faço pesquisas sobre os produtos da empresa e além das horas extras gratuitas, também preciso dedicar cerca de 20 horas do meu tempo além do horário de trabalho”, explicou.
Kazuhiro tem trabalhado excessivamente, sacrificado sua vida privada e por uma renda apertada para as despesas cotidianas.
“Eu tenho dívida de bolsa de estudos para pagar e vivo em uma região que precisa de carro e tenho que dar conta do aluguel. E quase não tenho tempo, então é impossível arrumar uma esposa e ainda mais inviável ter filhos nessas condições”, lamentou.
Questionado sobre os motivos para não procurar um outro emprego, ele pareceu desiludido:
“Na empresa anterior eu chegava a fazer 200 horas extras gratuitas no mês. A verdade é que estou melhor agora”, diz.
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As empresas com horas extras gratuitas
Cair em uma empresa “black” no Japão pode ser um caminho sem volta para o trabalhador. A cultura de trabalho vê com preconceito aqueles que ficam trocando de empresa e a ideia de passar a vida produtiva inteira no mesmo serviço ainda é algo desejado nas corporações.
Com isto, os trabalhadores que caem na rede de empresas ruins, com condições que vão contra as leis de trabalho, podem ficar sem boas oportunidades. Ao sair da empresa, o registro aponta para a desistência do emprego, mesmo que tenha sido por condições como as horas extras gratuitas. A idade também começa a pesar e ao passar dos 30 anos, vai ficando mais difícil encontrar uma vaga em uma boa empresa.
Enquanto isto, as “blacks” estão sempre de portas abertas. Por causa da alta rotatividade de trabalhadores, sempre há vagas disponíveis, poucas exigências para a contratação e promessas de condições que acabam não sendo cumpridas. Assim como Kazuhiro, um trabalhador que sai de uma empresa dessas acaba caindo em outra facilmente.
Isto resulta em um grande prejuízo para a saúde mental, exaustão e dificuldades em ter uma vida privada, fora das questões de trabalho. Os que não aguentam acabam morrendo por problemas cardíacos, suicídio ou outra condição causada pelo excesso de trabalho, um problema conhecido como “karoushi” e que afeta a sociedade japonesa.