Tóquio – Todo mundo precisa desabafar de vez em quando e se não tem um amigo confiável para isso, por que não pagar uma pessoa para emprestar os ouvidos durante algumas horas?
O aluguel de pessoas no Japão já se tornou uma atividade comercial comum: homens bonitos são alugados para limpar as lágrimas das clientes, mulheres jovens são alugadas para festas do pijama que vão resultar em fotos nas redes sociais.
Mas uma reportagem do Jornal Asahi trouxe outro tipo de aluguel que vem ganhando popularidade: a possibilidade de pagar um valor pequeno para um homem mais velho ouvir sobre seus problemas pessoais.
No fim de novembro do ano passado, uma japonesa de 32 anos de idade que mora em Soka, na província de Saitama, se encontrou com um homem em um café de Akihabara.
Quem passou pelos dois pode ter pensado que se trata de um casal, de amigos, colegas de trabalho ou que são da mesma família. Mas, na verdade, eles não se conheciam.
A mulher alugou o tempo do homem e enquanto bebia o café, falou sobre o quanto o marido era inútil em casa.
“Acredita que ele me disse que estava nem aí para cuidar de criança? A gente tem dois filhos de 4 e 1 ano de idade. Ele fica no celular, come e sei deita no sofá, não é capaz de dizer um muito obrigado. Eu não sou governanta e muito menos um robô”.
O papel do homem era emprestar os ouvidos, conversar, fazer perguntas, concordar. Ajudar a mulher a se sentir mais leve, talvez ter algum insight sobre o que fazer, como melhorar a situação em casa ou como resolver os problemas familiares.
O homem em questão é Daisuke Toukairin, de 45 anos de idade. Ele tem prestado esse serviço ao custo de ¥1 mil por hora. Em novembro de 2021, ele se cadastrou em uma base de dados por ¥5 mil e se tornou apto a alugar seus serviços de amigo e ouvinte dos problemas alheios.
“O valor de ¥1 mil por hora é insuficiente para pagar as contar, por isto eu não faço isto pelo dinheiro. Meu objetivo é ajudar mesmo, sentir a alegria de fazer algo que vai melhorar a vida de alguém, que deixará uma pessoa grata”, comentou.
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Os homens que alugam seus ouvidos
De acordo com a reportagem do Jornal Asahi, este tipo de serviço de aluguel humano se tornou popular entre homens dessa faixa etária, de 45 a 55 anos. Cerca de 70 homens estão prestando o serviço em uma empresa administrada pelo escritor Takanobu Nishimoto.
“Os homens nessa faixa etária normalmente não sentem que tem um papel fixo e de importância na sociedade e em casa. São homens de meia idade que querem ser requisitados por alguém, sentem o desejo de serem úteis, de ter uma pessoa desejando sua presença”, explicou.
Por isto são atrativos para quem precisa ser ouvido, principalmente mulheres que cuidam de seus filhos e da casa com dificuldades, sem a colaboração do marido e sem ter muitos amigos que possam conversar e desabafar.
Além disso, alugar um senhor desconhecido para ouvir os problemas é confortável do ponto de vista das clientes, segundo Nishimoto.
“Elas se sentem mais à vontade e seguras para conversar com alguém que não conhecem, que está de fora de seus laços íntimos. Assim podem ter certeza de que a conversa ficará no sigilo, de que não serão expostas”.
Outra questão é que desabafar com alguém próximo pode trazer inseguranças. Para o professor do Departamento de Psicologia da Universidade Meisei, mesmo quem tem amigos pode preferir desabafar com uma pessoa alugada do que um alguém próximo.
“Uma característica humana muito comum é a preocupação de dizer algo que afete o relacionamento com um amigo ou pessoa íntima, dar uma declaração desajeitada e prejudicar uma amizade. Se for alguém de fora, não é preciso encontrar uma segunda vez e isto traz tranquilidade para conversar”, explicou.
A mulher que alugou os ouvidos de Daisuke Toukarin, ficou duas horas conversando com o homem na cafeteria e diz que saiu mais leve da experiência.
“Eu achei que seria melhor conversar com alguém de fora e não com uma amiga ou conhecida que faz parte do meu círculo social de mães e que tem seus preconceitos. Eu sabia que ele responderia de forma mais apropriada e faria eu me sentir bem”, comentou.
Eles se despediram na estação e combinaram de bater mais papo mais uma vez.