Tóquio – Era madrugada de 29 de dezembro, dias antes da virada do ano para 2023 quando um homem, incomodado com o barulho, espiou a rua pela janela de casa. A visão que teve o deixou surpreendido.
“Uma ambulância tinha batido no canteiro central da avenida e havia muitos policiais e funcionários do serviço emergencial em volta. Acho que eles ficaram lá até por volta das 6h da manhã. Tem muitos carros que aumentam a velocidade e este é um ponto comum de acidentes, mas foi a primeira vez que vi uma ambulância tombada”, contou.
Não foi um simples acidente por distração, mas um alerta que indica a necessidade de mudar o sistema e a dinâmica de trabalho de quem lida com casos emergenciais, de pacientes que podem estar entre a vida e a morte.
O caso aconteceu em Akishima, uma cidade na província de Tóquio. O impacto da batida fez a mureta de ferro voar e o vidro da ambulância acabou estilhaçado. Os três funcionários que estavam no veículos ficaram feridos.
O motorista é um homem na faixa de 50 anos, que acabou dormindo enquanto dirigia. Um ato de irresponsabilidade que teve uma justificativa: ele estava trabalhando há 17 horas ininterruptas, sem direito a nenhum descanso.
De acordo com uma reportagem da Revista Friday, em todo o ano passado, o Departamento de Bombeiros de Tóquio registrou 872.101 casos de ocorrências emergenciais, o número mais alto de todos os registros.
O tempo de serviço de uma equipe de atendimento emergencial aumentou em 4 horas em comparação ao ano anterior e passou de 15h30 por dia. Na cidade de Yokohama, capital da província de Kanagawa, também houve aumento histórico no número de ocorrências e tempo de serviço.
É uma situação que vem afetando o serviço emergencial em muitas regiões do Japão.
Sem tempo para comer ou descansar
Trabalhar 15 horas ou mais em um dia sem parar para comer ou descansar um pouco deixa qualquer pessoa no limite de suas necessidades mais importantes. Mas é o que vem acontecendo com quem atua em ambulâncias e passa o dia entre um atendimento e outro, sem tempo a perder já que são muitas vidas em jogo.
“As solicitações de socorro chegam uma atrás da outra e muitas vezes os hospitais rejeitam por não terem leitos disponíveis. Por isso, o tempo com um paciente se torna mais longo e tem dias que realmente não é possível parar para comer ou descansar”, disse um funcionário dos bombeiros de Tóquio.
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O transporte de infectados
O sistema médico japonês segue sobrecarregado com os casos de coronavírus. Reprodução / Friday.
E não é apenas no caso dos bombeiros, mas também os serviços privados de ambulância e transporte de pacientes. Depois da pandemia do coronavírus, a situação acabou se agravando com os numerosos casos de infectados necessitando de atendimento emergencial.
Hirotaka Usui, presidente da empresa Star Kotsu que presta um serviço privado de ambulâncias na província de Gunma, contou ao Friday um pouco da situação atual:
“A sede do atendimento hospitalar de Gunma faz uma solicitação atrás da outra para que a gente transporte pacientes do coronavírus. Há casos de 10 atendimentos em um único dia e as nossas quatro ambulâncias estão rodando sem parar o tempo todo. Acredito que só o serviço público não dê conta e o acidente de Akishima não me causa nenhuma estranheza”, relatou.
O serviço emergencial continua sobrecarregado com os casos de coronavírus, o que acaba sobrecarregando também os funcionários. O diretor da Instituição de Pesquisa do Sistema Médico, Hiroshi Honda, alertou para a importância de manter a população ciente dos casos.
“Muitas restrições foram levantadas e há muita gente querendo parar de usar as máscaras, mas os casos de óbito por coronavírus estão batendo recordes diários, os hospitais estão pressionados e a situação de saúde pública não melhorou. É importante seguir tomando medidas preventivas”, disse.