Tóquio – A vida pode mudar por completo depois de um grave acidente que deixa sequelas e limitações físicas. Quem passa por isso precisa aprender a viver de novo e passar por um processo de superação, considerando a nova realidade, os obstáculos psicológicos e o trauma provocado pela experiência.
Foi isto o que aconteceu há dez anos com o japonês Chihiro Yamada, que hoje tem 30 anos. De acordo com uma reportagem do Portal J-Cast, Yamada sobreviveu a um acidente que lhe custou as duas pernas e o braço direito. Quando acordou na cama do hospital e descobriu o que aconteceu, viveu o choque da nova realidade.
Mas o luto não durou muito tempo e ele logo entrou no processo de superação. Entre 7 e 10 dias depois, ele começou a se reerguer e decidiu que iria desenvolver sua autonomia com a mão esquerda que era tudo o que tinha. Yamada era destro e teve que encarar o desafio de aprender a fazer tudo com a mão que não dominava.
“Eu me dei conta de que a mão esquerda e a direita possuem a mesma força. Percebi que tinham muitas coisas que eu poderia fazer se aprendesse e mudei meu sentimento ainda na cama do hospital”, relatou.
O jovem Yamada, que tinha 20 anos na época, se desafiou a aprender tudo o que podia e 10 anos depois, ele usufrui de um estilo de vida em que pode morar sozinho e não precisa de ajuda. “A única coisa que eu desisti de fazer nesses anos foi tentar amarrar os sapatos”, comentou.
Para o J-cast, ele contou como se desenvolveu e aprendeu a fazer tudo do zero, até ter domínio total com a mão esquerda. E o que aprendeu nessa jornada de enfrentar a situação com positividade para ter uma qualidade de vida parecida com a que tinha antes do acidente.
Treinos diários no hospital
Eu era destro e a primeira atitude que tomei foi aprender a escrever com a mão esquerda, que eu usava muito pouco antes. Quando perdi a mão direita, a primeira sensação é de que eu tinha perdido tudo, mas depois eu percebi que estava errado e podia aprender a fazer as coisas com a mão que me restou.
Quando estava internado, a enfermeira e auxiliar tentaram me dar comida na boca, mas eu recusei e disse que faria sozinho. Peguei a colher e o garfo e comecei a praticar. Logo depois, comecei a escrever um diário com a mão esquerda e no começo a minha letra era horrível.
Eu escrevia uma folha de papel por dia, contando tudo o que tinha me acontecido naquele dia. Além de praticar a escrita, eu conseguia renovar meus sentimento e enfrentar as dificuldades de cada dia com a ajuda do diário. Eu escrevia o que comi no café da manhã e no almoço, o que senti e o que pensei naquele dia.
E não era só isso. Eu também entregava o diário para a enfermeira ler e os meus pais. Não escrevia sozinho, mostrava aos outros e era elogiado e isso me dava forças. Mostrar para outras pessoas também me motivava a melhorar a caligrafia para que ficasse fácil de ler.
Enquanto escrevia o diário, percebia que era divertido viver. Desta forma, não me deprimia no hospital por ter perdido minhas pernas e tomava consciência de que eu estava vivo e isso era o que realmente importava.
Faz 10 anos que estive internado e até hoje tenho o diário. Morro de rir quando leio, pois parece muito infantil. Mas foi uma rotina de dois meses, todos os dias, escrevendo uma página inteira e o resultado foi que eu aprendi a escrever bem com a mão esquerda enquanto ainda estava hospital.
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Aprendendo a viver de novo e superação
Depois de dois meses no hospital em Yokohama (Kanagawa), recebi alta e fui fazer a reabilitação em Saitama. Eu só tinha o braço e a mão esquerda para fazer tudo, então comecei a fazer treinos musculares para que o meu único braço se tornasse forte o suficiente. Se eu precisasse carregar peso teria que ser com uma única mão, então me esforcei bastante para isso.
Depois, comecei a praticar a coordenação com as pernas artificiais, com a ajuda do fisioterapeuta. Eu nunca tinha feito treinos musculares antes e não tinha muita força, mas continuei me esforçando e coloquei até um elástico na cama para puxar com a mão diariamente. Consegui força para levantar 50 kg, sendo que no começo conseguia no máximo 30 kg.
Antes do acidente, eu tinha um trabalho que não exigia o uso do computador, então eu mal sabia mexer. Agora, trabalho no departamento administrativo de uma empresa que presta serviço para aeroportos e faço tudo no computador com a minha única mão. Eu tive que aprender a usar a máquina e a digitar, pratiquei muito e hoje sou capaz de digitar bem até sem olhar o teclado.
No dia a dia eu faço tudo sozinho. Faço comida, troco de roupa, limpo a casa e lavo roupa. Consigo pendurar as roupas no varal e em cabides. Só não consigo amarrar os sapatos, mas faço todo o resto.
Eu inclusive já fui passear no spocha (centro de jogos e esportes) e antes de ir, não saberia o que poderia fazer, mas me surpreendi. Consegui rebater a bola duas vezes, joguei futebol e fiz dois gols, joguei basquete, vôlei e beisebol.
Desde que tomei a decisão ainda no hospital de que faria tudo sozinho, tive muitos desafios no processo de superação. Precisei de muitos treinos e me senti motivado, pois não queria que as pessoas me vissem como um inválido. Eu segui em frente com a condição que eu tinha de enfrentar e graças a esse esforço, posso ter uma vida independente hoje.