Kawasaki – A vida pode mudar da noite para o dia e as coisas que eram normais e parte de uma rotina feliz, de repente, desaparecem.
Kono Igarashi só tinha 8 anos de idade quando passou por isso. A menina japonesa era saudável, alegre, tinha muitos amigos e gostava de dançar. Tudo mudou em 2020, quando ela começou a ter sintomas que pareciam uma gripe comum.
Os pais acharam que a filha ficaria bem em alguns dias, mas os sintomas persistiram. No hospital, os médicos descobriram que o coração de Kono não funcionava bem. Foram muitas internações, idas e vindas até o diagnóstico no ano seguinte: a única cura possível era um transplante de coração.
A história foi contada em uma reportagem da Emissora Fuji e os pais da menina relembraram o choque que tiveram com a notícia.
“Eu já tinha visto isso em filmes e novelas, mas nunca imaginei que a minha própria filha precisaria de um transplante de coração”, contou o pai, Yoshihide Igarashi.
A primeira atitude da família foi pesquisar se seria possível fazer o transplante no Japão, mas as perspectivas eram péssimas. A média de transplantes de coração no país é de 50 a 60 por ano, com poucos casos de doadores menores de 18 anos.
A função cardíaca de Kono estava diminuindo cada vez mais, até que ela precisou de equipamentos para se manter viva. Os pais se alternavam diariamente para estar com a filha e nessa época, Kono foi entrevistada pela Fuji e disse o que era seu maior desejo:
“Eu só gostaria de voltar a brincar com os meus amigos e poder ir para a escola”.
O que era normal e rotina na vida da criança até o ano anterior, tinha desaparecido por completo. Em troca, Kono via aparelhos médicos, o ambiente do hospital, tristeza, medo e o âmparo das pessoas próximas.
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A saga pelo transplante nos EUA
De acordo com a reportagem da Fuji, a família ainda tinha esperanças de conseguir a cirurgia no Japão, mas no outono de 2022, perceberam que se ficassem esperando, dificilmente iria aparecer um doador para a filha.
Os pais de Kono decidiram que o melhor era fazer a cirurgia nos Estados Unidos, o que é uma prática muito comum nos casos de pessoas que precisam de transplante no Japão. Mas o custo é alto e para dar certo, é preciso reunir doações.
No caso de Kono, houve o efeito negativo da desvalorização do iene e para que a família pudesse fazer a viagem e a cirurgia, teriam que pagar ¥540 milhões. Em novembro do mesmo ano, houve uma coletiva de imprensa na frente da Prefeitura de Kawasaki, em Kanagawa e no mesmo dia, equipes de voluntários iniciaram a arrecadação nas áreas próximas das estações de trem.
Os colegas da escola e amigos de Kono também ajudaram. A mobilização social permitiu que a família atingisse a meta financeira em março de 2023. Porém, na mesma época, a condição da menina piorou. Ela só tinha a função do lado direito do coração e houve uma piora: Kono precisou ligar mais aparelhos no peito para continuar viva.
Os riscos da cirurgia e o milagre
Depois de arrecadar o dinheiro, houve um novo desafio. O médico responsável pela paciente disse que não poderiam mandá-la aos Estados Unidos nas condições em que Kono se encontrava, pois o risco da viagem era alto demais. Os preparativos para a viagem e aceitação no hospital norte-americano foram interrompidos.
Ela voltou para a fila de espera por órgãos no Japão, que tem 16.142 pessoas e mais de 800 aguardando por um coração (segundo os dados de 2023). Quando um órgão é disponibilizado, o contato é rápido e se não for possível falar com o primeiro da fila, os próximos são contatados para que o órgão não acabe desperdiçado.
No caso do coração, o transplante deve acontecer em menos de 4 horas. O tempo é apertado e a família do paciente precisa estar atenta o tempo todo.
As esperanças da família eram pequenas, mas um “milagre” aconteceu. O que salvou Kono foi uma ligação no telefone de seu pai em uma madrugada.
“Fui informado de que um doador havia aparecido. Eu não podia acreditar, parecia mentira. Mas estava acontecendo de verdade”, relembrou, emocionado.
Foram mais de 10 horas de cirurgia e tudo ocorreu bem. A menina se recuperou, passou por reabilitação e no Natal do ano passado, conseguiu voltar para a casa pela primeira vez em três anos.
“Foi terrível o que aconteceu com o corpo da Kono, mas nós chegamos até aqui com a ajuda de muitas pessoas e é gratificante ter superado tudo isso. Nunca vamos esquecer esse sentimento de gratidão”, disse o pai.
No mês passado, a menina finalmente voltou para a escola e foi recebida com comemorações. No quadro da sala de aula, colegas e professores escreveram mensagens de carinho e boas-vindas.
A rotina voltou ao normal depois de três anos de luta pela vida e superação.