Nanao – Muitas cidades na província de Ishikawa estão com os abrigos lotados de vítimas dos fortes tremores de terra que atingiram a Península de Noto no primeiro dia do ano. Mais de 5 mil construções foram danificadas ou completamente destruídas, há muitas pessoas que perderam suas casas e estão dependendo de doações.
Em meio à destruição que um desastre natural provoca, sempre há a união, a força e ações solidárias para ajudar aqueles que estão precisando. Porém, nem sempre as intenções são boas e um abrigo na região acabou tendo que lidar com uma situação bastante incômoda.
Norio Kawamoto, chef de um restaurante na cidade de Kanazawa (província de Ishikawa), está contribuindo em um abrigo na cidade de Nanao como voluntário. Nesta semana, ele postou na rede X (o antigo Twitter), um desabafo sobre as doações recebidas.
Um caminhão chegou na escola primária que está sendo utilizada como abrigo e descarregou uma montanha de caixas com itens que deveriam ajudar as vítimas do desastre. Mas quando Norio e outros voluntários verificaram as caixas, só sobrou uma grande frustração.
Havia inúmeras sacolas de roupas velhas de todos os tipos e com pouca serventia e todas as bebidas contidas nas caixas estavam vencidas, uma delas tinha a data de vencimento marcada para junho de 2019.
“A maioria dos itens que chegou é lixo e não podemos aproveitar. Vocês estão pensando que o abrigo é o quê?”, disse o chef, revoltado na publicação. “Ontem chegou um caminhão com a placa de Nagano, descarregou inúmeras caixas, mais da metade com lixo e foi embora”, comentou.
Leia também: Ishikawa tinha se recuperado de terremoto vivido há 17 anos: “lutamos para reconstruir e agora perdemos tudo de novo”
As perdas e o problema das doações
Quem está nos abrigos sofreu muitas perdas com o desastre. Há casas danificadas, estruturas que desabaram e outras que podem desabar se um novo tremor de forte intensidade acontecer. São milhares de pessoas dividindo os espaços dos ginásios escolares e dependendo das doações para se manter.
Norio Kawamoto deu entrevista para a Emissora Fuji e contou que seu próprio restaurante também sofreu danos em Kanazawa. A capital da província foi menos afetada do que as cidades próximas da Península de Noto, mas não passou ilesa pela tragédia.
No caso de Norio, muitos utensílios de cozinha caíram e quebraram, o chão se tornou um mar de garrafas de vinho, partidas ou danificadas. Houve também danos nas paredes do restaurante e o custo será alto para retomar a atividade comercial.
Mesmo assim, o chef largou suas próprias preocupações para ajudar os desabrigados que sofreram danos ainda maiores. Ele viajou três horas até o abrigo em Nanao para trabalhar voluntariamente na distribuição de alimentos aos refugiados na escola.
As doações que chegam não são poucas. Segundo ele, todo dia há uma quantidade enorme de caminhões e caixas sendo entregues na escola. O hall de entrada está cheio das caixas que deviam conter mantimentos e outros itens de necessidade para a vida cotidiana.
As doações são de pessoas físicas ou empresas privadas e são tantas que as caixas já começaram a tomar o espaço das salas de aula. Os voluntários precisam verificar caixa por caixa, fazer uma triagem entre o que pode ou não ser utilizado e apesar das numerosas doações, muitos itens não servem para nada ou estão vencidos.
“Olhei muitas caixas e não encontrei um item que servisse para o jantar. Só tem banana, quase não tem ingredientes que podem ser utilizados para preparar a comida. Tem 250 pessoas neste abrigo e para dar conta do café da manhã e da janta, precisamos preparar 500 refeições”.
Depois de garimpar as caixas em busca de itens que sirvam para a janta, Norio se desafia a preparar a comida dos desabrigados, mas a tarefa diária é quase impossível.
“É complicado preparar comida para 200 pessoas com o que temos. Todos os dias é esse transtorno com as doações. Há muitos itens congelados, mas aqui é uma escola e não tem freezer. A gente não pode dar esses alimentos por causa do risco de intoxicação, é importante que os doadores saibam disso”, desabafou.
Por conta do volume de doações e falta de utilidade em muitas delas, o abrigo acabou interrompendo o recebimento de doações privadas.
“Atualmente, não conseguimos acompanhar a triagem, então interrompemos as doações privadas. Temos muitos itens que se acumularam dia após dia. O apoio genuíno e realizado com boas intenções é muito bem-vindo, é disso que precisamos”, disse.