Nagoya – As reviravoltas da vida são capazes de levar alguém da miséria à riqueza ou, ao contrário, da riqueza à miséria, até a vida como morador de rua.
Esta é história de Hiro Ito, de 69 anos, que é morador de rua há mais de 10 anos. Ito vive em um espaço em Nagoya (Aichi), montado com coisas que foram jogadas fora por outras pessoas.
Ele passa o dia catando latinhas e consegue tirar cerca de ¥40 mil por mês com o trabalho. O dinheiro é usado para bancar a própria alimentação, a ração de Sora, seu gato de estimação e para comprar cigarros e bebidas alcoólicas.
Ito deu entrevista para a Tokai TV e mostrou um pouco de seu estilo de vida. Cuidar do gato é uma de suas prioridades.
“O gato tem mais despesas do que eu. são seis sacos de ¥700, o que dá quase ¥5000. A alimentação dele vem primeiro”, diz.
Ito compra comida em um mercado próximo e sempre faz as refeições depois do gato. Costuma se alimentar duas vezes ao dia.
Passado como empresário
A vida de Ito nem sempre foi assim e ele esconde um passado muito diferente da realidade que vive hoje.
Há 16 anos, Ito era presidente de uma empresa de construção e chegava a lucrar ¥50 milhões por mês.
“Quando lembro disso sinto vontade de rir. Do lucro mensal, sobrava de ¥7 milhões a ¥8 milhões. A gente tinha sete carros, um para mim, outro para a minha ex-esposa, um só para compras e tínhamos até um para camping”, diz.
No entanto, a empresa começou a ir mal e faliu quando Ito tinha 53 anos. Ele foi trabalhar em outra construtora depois disto, mas houve um problema e não pode mais trabalhar.
Hoje, sua rotina é bem diferente do que era antigamente. Ele vai trabalhar um pouco antes das 10h da manhã e roda a cidade durante sete horas em uma bicicleta.
Durante quatro dias na semana, Ito junta cerca de 35 quilos de latinhas e vende por ¥2.800. Esta prática de reciclagem independente é proibida em algumas cidades japonesas, mas não em Nagoya.
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Morador de rua e benefícios
Habilidoso com itens domésticos, Ito montou um lugar para morar a base de objetos coletados ou doados. Ele tem televisão e energia elétrica que funciona por um gerador.
No ano passado, ele improvisou uma “banheira”, que funciona a base de água esquentada por três fogões portáteis.
De vez em quando, Ito recebe a visita de uma enfermeira voluntária, que faz uma checagem de saúde. A enfermeira já conversou com ele sobre a possibilidade de pedir o benefício social para quem não tem renda ou tem renda baixa.
Ito poderia se inscrever no “seikatsu hogo” na prefeitura e completar a renda para viver em um apartamento, mas ele não quer.
“Ele diz que não quer só ganhar dinheiro e ficar olhando para as paredes dentro de um apartamento. Ele diz que quando estiver mal de saúde vai pedir, mas que por enquanto pode continuar suas atividades”, contou ela.
No entanto, Ito tem outra motivação para negar o benefício: a vergonha de que seus familiares descubram sobre sua situação.
O sobrenome “Ito” é fictício e ele não diz seu nome verdadeiro nem para a prefeitura, quando recebe visita de algum funcionário. Divorciado, o homem não vê o filho desde que o menino tinha 3 anos.
Se fizer a inscrição, ele teme que a prefeitura contate sua família e pergunte se não podem ajudá-lo financeiramente.
“Eu penso no meu filho que perdi o contato há muito tempo e muitas outras coisas. Não quero que eles saibam como eu estou hoje, se for pedir um benefício, a prefeitura vai fazer contato”, hesita.
Este pode ser o motivo para que muitas pessoas em situação de rua hesitem o cadastro no auxílio subsistência, além das dificuldades do sistema para a obtenção do benefício mesmo quando se tem direito.
Por fim, Ito faz questão de passar uma mensagem através da reportagem da Tokai TV.
“Só quero que me deixem dizer isto. O gato é o meu filho, quero que construam um mundo para que ele possa viver depois que eu morrer. Quero que ele possa viver sossegado mesmo que seja na rua. Apenas isto, muito obrigado”.
Ito já não se preocupa com o seu passado. Enquanto junta latinhas para a alimentação, se preocupa em ter o suficiente para ele mesmo e Sora. E assim, leva uma vida com o básico de que precisa para a sobrevivência.