Tóquio – Usar máscara nunca foi novidade aos japoneses, que são criados em uma cultura em que o acessório é de uso comum em espaços públicos para evitar alergias e não transmitir viroses.
Depois da pandemia e com a necessidade de prevenir a transmissão do coronavírus, os japoneses se adaptaram rápido ao estilo de vida em que as máscaras são de uso diário. Andar na rua sem a cobertura passou a causar uma tensão, olhares tortos, vergonha e medo do julgamento alheio.
A pandemia já passou de dois anos, os casos diminuíram na medida em que as vacinas foram ampliadas. Países na Europa e os Estados Unidos já afrouxaram medidas e em alguns lugares, as máscaras foram deixadas totalmente de lado.
Na Ásia, a situação segue rigorosa em alguns locais, como a China que impõe um lock down pesado como parte do plano político de barrar totalmente a disseminação do vírus. No Japão, apesar do reconhecimento da baixa nos casos em todo o país, há algumas oscilações o governo não ousa declarar que as máscaras podem ser abandonadas.
A situação ainda é de insegurança e em meio ao receio de largar a proteção, outra questão toma conta dos noticiários: os meses de junho a agosto devem ser de calor escaldante e pelo terceiro ano seguido, a população deve enfrentar o perigoso calor do verão japonês com o agravante das máscaras.
Alguns especialistas defendem que é hora de largar a máscara, pois neste momento, o risco de hipertermia já é mais grave do que de agravamento dos sintomas do coronavírus. Em entrevista ao portal All About, o especialista em primatologia Nobuo Masataka fez outra consideração: o uso prolongado das máscaras pode causar um dano grave ao psicológico humano.
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Macacos de Máscara
Nobuo é especialista em primatas, mas fez comparações interessantes entre os animais que são os mais próximos dos humanos. No mundo dos macacos, sentimentos como raiva, medo e intimidade são expressados pelos movimentos dos lábios. No mundo dos humanos, esta característica também está presente.
Expressamos conforto, alegria e intimidade com sorrisos, medo ao tremer os lábios, raiva ao comprimi-los. A comunicação humana é afetada quando tudo o que podemos fazer é trocar olhares e mexer as sombrancelhas.
Em seu livro “Macacos de Máscara” (Masuku wo suru Saru / マスクをするサル), disponível na Amazon, Masataka explica:
“É difícil ler os sentimentos dos outros de máscara. Se pensarmos pelo senso comum, a quantidade de informações que obtemos pelos comunicação visual foi reduzida com as máscaras, estamos com dificuldades para entender uns aos outros”.
Segundo Masataka, o problema vai além disso:
“Temos dificuldade até de reconhecer os conhecidos de máscara. Se passarmos tempo demais assim, os adultos que tiveram anos de experiência em relacionamentos humanos normais ainda estão bem, pior são os jovens que estão iniciando a vida em um mundo expressado por baixo de máscaras”, refletiu.
Uma parte da roupa íntima
Masataka trata a situação atual em que a sociedade no Japão vive como um grande “buraco negro” no rosto das pessoas. O que começou com a ideia de prevenir um vírus foi além, se tornou um objeto relacionado ao medo de ser julgado ou até de sofrer ataques ofensivos em públicos.
“Há um psicológico ligado ao sentimento de que não se pode sair de casa sem máscara. Se você tirar em público, sente medo dos olhares alheios e mesmo quando está com alguém próximo fica com um receio que se transforma em vergonha. A humanidade sempre impôs que devemos cobrir as genitais em público, desde Adão e Eva na Bíblia. E agora estamos perto de transformar as máscaras em uma roupa íntima”, diz.
No transporte público, os anúncios do Ministério da Terra, Infraestrutura, Transporte e Turismo pedem que os passageiros permaneçam de máscaras. Nos grandes eventos, elas são indispensáveis.
“Quando usar máscaras deixar completamente de ser não-natural, isto pode mesmo se tornar como uma calcinha ou cueca. As pessoas terão medo de serem vistas sem máscara da mesma forma que sentem medo de serem vistas nuas em público”, sugeriu.
Talvez seja melhor o Japão não demorar muito para retomar a vida sem máscaras, na medida em que os riscos do vírus diminuem a ponto de ser possível voltar ao normal de antes da pandemia.