Tóquio – As leis trabalhistas nem sempre são respeitadas no Japão e as empresas que cometem irregularidades, promovem o excesso de trabalho além dos limites e em péssimas condições, são identificadas como “black kigyou” em japonês.
O Portal Career Connection, que trata de assuntos trabalhalistas e vagas de emprego, costuma fazer pesquisas periódicas entre os trabalhadores, reunir histórias impactantes e compartilhar em reportagens.
Nesta semana, o portal trouxe o caso de uma japonesa que participou de uma das pesquisas e trouxe um relato pessoal. Mika* tem idade na faixa de 50 anos, vive na província de Iwate e hoje trabalha como freelancer: a renda não chega a ¥1 milhão por ano.
Ela contou que há algum tempo, conseguiu uma vaga para trabalhar na cozinha do restaurante de um hotel. O serviço que prometia ser tranquilo, acabou se tornando um pesadelo: a funcionária trabalhava por mais de 12 horas seguidas, sem ter direito nem ao descanso de almoço.
“Se eu parasse para almoçar e descansar, isto afetava o serviço da tarde e por isso eu tinha que trabalhar esse tempo todo sem parar. E mesmo me dedicando durante mais de 12 horas diárias, o serviço se acumulava e não acabava nunca”, contou.
A cultura de trabalho pode ter sido um dos problemas, mas o que chamou a atenção de Mika neste emprego é que os trabalhadores efetivos e com conhecimento sobre o serviço eram poucos, faltava mão de obra e as lacunas eram preenchidas com funcionários enviados por empreiteiras.
“Chegava gente nova o tempo todo e com zero experiência. Este nem era o meu trabalho, mas eu tinha que parar tudo para orientar os novatos no serviço e assim não conseguia fazer o meu trabalho. Era exaustivo”, comentou.
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Os efeitos do trabalho na saúde mental
O excesso de trabalho indiscriminado é uma das causas de morte de trabalhadores no Japão. Por vezes por doenças, ataques cardíacos ou AVC, em em alguns casos por suicídio, depois de um longo período de serviço que afeta a saúde física e mental.
No caso de Mika, o trabalho extremo durou um pouco mais de 3 meses, até que ela decidisse pedir demissão. A japonesa contou que tem apenas um arrependimento:
“Eu deveria ter parado bem antes. Eu me desgastei demais, prejudiquei a minha saúde e estou até agora tentando me recuperar dos efeitos negativos desse trabalho na minha vida”, desabafou.
As coisas não começaram de uma maneira terrível para Mika. Ela contou também que no início, era mais leve e o chefe até dizia que ela podia ir para a casa quando o trabalho estava mais ou menos concluído. Mas depois de algumas semanas, o ritmo se intensificou e ela não teve mais tranquilidade para trabalhar.
“O volume de trabalho foi aumentando dia após dia até chegar nesta situação. Eu não reclamei com ninguém, mas meu chefe veio falar que estava sofrendo pressão e estresse. O ambiente era muito ruim”.
O reconhecimento de que a empresa é o que os japoneses chamam de “black” e que o melhor é pedir demissão, pode levar algum tempo. Enquanto isso, há o desgaste físico e mental em casos como o de Mika e que pode evoluir de um jeito perigoso.
*nome fictício.