Tóquio – O Japão é um país que sofre com o alto índice de suicídio, que afeta pessoas em todas as idades. Há centenas de casos por ano de crianças e adolescentes que tiram a própria vida por problemas na escola, bullying ou problemas em casa.
Há também muitos trabalhadores em situação de aperto financeiro, excesso de trabalho e problemas de relacionamento na empresa. Mães em casamentos complicados e em sofrimento psíquico, que cometem o temido “murishinju”, que é o ato de matar os filhos antes de se matar.
Nesta mesma semana, houve um caso estarrecedor em Osaka: uma mulher na faixa de 40 anos empurrou os dois filhos da janela do 9º andar do apartamento onde morava antes de pular. A mãe e o menino, que tinha 5 anos, foram encontrados mortos. A menina foi socorrida e está gravemente ferida.
As notícias de suicídio entre famosos também encorajam os atos na população e tem se tornado um problema. Depois da pandemia, houve vários casos de celebridades encontradas mortas. Mais recentemente, o ator Kamejiro Ichikawa, de 47 anos, foi preso por “auxiliar” no suicídio dos próprios pais.
E este mês, o país lamentou a perda de Ryuchell em mais um caso de suicídio. O modelo, cantor e ativista da comunidade LGBTQIA+, de 27 anos, foi encontrado morto em Tóquio.
Para enfrentar a onda de desgostos e evitar que muitas outras pessoas que já estavam cogitando o suicídio deem esse passo, os números de atendimento do serviço Telefone para a Vida (inochi no denwa) passaram a ser amplamente divulgados junto com as notícias.
O serviço está espalhado em 50 locais pelo Japão e oferece consultas gratuitas para quem está em sofrimento e pensando em morrer. É a oportunidade de desabafar, conversar com alguém solidário e que tem experiência e encontrar uma nova oportunidade para longe da ideia de morrer.
Um serviço mais do que necessário na teoria, mas na prática, não tem funcionado muito bem. De acordo com uma reportagem do portal Post Seven, as reclamações são de linhas sempre lotadas, dificuldade de conseguir atendimento e frustração por parte dos agentes que ficam no telefone: há muitas ligações mal intencionadas.
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Os problemas do serviço telefônico
Akihiro Kato, líder da Associação Telefone para a Vida de Aichi (Aichi Inochi no Denwa Kyokai) explicou por que o serviço não tem conseguido atender a demanda.
“Antigamente a gente tinha cerca de 200 pessoas atendendo as ligações, mas muitos eram idosos e com o tempo, o número foi diminuindo. Hoje são 160 atendentes, mas não conseguem dar conta de todas as ligações, a demanda chega a ser 10 vezes acima da capacidade de atendimento atual”, comentou.
E isto tem acontecido também por causa da ampla divulgação dos números. Depois do suicídio da atriz Yuko Takeuchi, em setembro de 2020, o Ministério da Saúde do Japão passou a seguir as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS) para conter a divulgação da mídia e divulgar os números de atendimento para suicidas junto com as notícias.
Isto acabou aumentando a demanda para muito além da capacidade. Uma atendente de 60 anos contou para a reportagem que, além de não dar conta das ligações, também perde tempo com chamadas desnecessárias.
“É só a minha impressão pessoal, mas quando há notícias de suicídio as ligações aumentam e há muito mais chamadas perdidas que o normal. E também aumentam os telefonemas que são trotes e sem propósito. Nossa missão é evitar o suicídio e queremos conversar com as pessoas que estão sem saída, decidindo que irão morrer, mas nem sempre conseguimos”, lamentou.
A atendente também ficou confusa sobre a ideia de divulgar mais os números. Algo que deveria ser bom, mas na prática, não tem sido muito eficiente para o propósito do serviço.
“É bom que mais pessoas saibam o número para ligar, mas isto também atrai muitas pessoas sem coração que ocupam o nosso tempo à toa. Só posso dizer que isso é triste e lamentável”, comentou.